Mateus 7.6 – XXIX

 

XXIX

 

Porque não sobrevives, amor, ao meu lado, restaurando a 
imagem que consentes de mim, sem que eu fique fábula ou 
irreconhecível.

 

Amor, porque sobrevives, imerso, pendente na corrosiva 
penumbra em que persistes, cantando tudo, deturpando a 
imagem, as imagens, amor, falando outra língua. Como se a 
natureza humana ficasse tão distante, fosse tão estranha.

 

Meu amor de tudo o que não posso, estreito ribeiro me deixas – 
pleno fio de liberdade e convulsão de dias – sustendo-me amor, 
amor o desejo de mais ser-te impossibilidade.

 

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Mateus 7.6 – XXVIII

 

XXVIII

 

Exausta da minha solidão, amor, vou olhando para os espelhos, 
e furtivo (amor) é o bater de asas das borboletas, quando 
morcego te aproximas para um jantar, por entre licores e a 
pobre música do acaso.

 

Uivando, amor, estão os lobos na alcateia, à margem de um 
lago negro, vendo os seus lacustres rostos deformando-se na 
imensidão de um amor, que – só – no reflexo vê a afabilidade 
da face, dissimulando (amor) à beiras das lágrimas.

 

 

Revê a fome de teu corpo, amor, entregando-se cintel, e no 
fôlego: o desejo de ti, livre respirar.

 

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Mateus 7.6 – XXVII

 

XXVII

 

No tempo das buganvílias, amor, as noites segredam os seus 
desejos em estivais sorrisos de pálpebras, e os corpos 
aproximam-se nos precipícios como se tivessem asas que os 
resgatassem na queda.

 

Mas nos promontórios não há festa em que não se sangre, em 
que não se desconheça um vazio independente esperando-nos enlace.

 

Nas noites quentes da floração das buganvílias, amor, as 
minhas asas abeiraram-se do festim e eu sangrei durante muito 
tempo (amor).

 

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Mateus 7.6 – XXVI

 

XXVI

 

Rendo-me, amor, à ausência, fustigando tudo o que em mim 
me enraíza a ti – obrigada – sem que milagre algum nesta terra 
derrote o desígnio.

 

Por vezes, amor, sei que não existo dentro das tuas pálpebras 
como libertinagem que apaixona e – só – empreendo no lapso: 
uma morada de maçãs verdes como a minha habilidade ou de 
romãs vermelhas à mercê das tuas mãos de música, tocando na 
corda exacta (amor) o som que sibila o mistério. 

 

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Mateus 7.6 – XXV

 

XXV

 

Não sei de que se faz a indiferença, amor, como podes trazer-
-me dentro sem que não te ilumines, sem que não te censures 
perversamente, sem que não saibas quando te olho: vou 
morrendo como uma pedra insensível ao teu bem.

 

Sei, sei, amor, que devolvo em tinta bruta os meus olhos 
fulminados, enquanto me trespassas sem murmúrio. 

 

E ser-te na multidão o golpe do tempo, a tatuada noite de 
pegadas – vazios de ti, em mim, contrafeitos raro sol.

 

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Mateus 7.6 – XXIV

 

XXIV

 

Malograr, amor, é tão excêntrico, neste ser-te. Porque não te 
descuidas? Eu que dos meus olhos exclui o mundo para que 
possas reflectir a minha sombra segurando-me os ombros, 
também me perdi sem contenda na ruptura.

 

Só e ignorante é o poder, amor, de não saberes ler a rendição 
irreprimível ou eu desconhecendo a tua solitude, o artefacto 
(amor) raro e fechado sobre ti.

 

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Mateus 7.6 – XXIII

 

XXIII

 

Ato ao meu desejo o teu corpo, amor. Ato amor ao desejo, ao 
meu corpo. Acto (amor) és tu. Ato-me a ti, de desejo 
comovida.
 
E tu?  Como me desprendes de ti?  Talvez incêndio ou morte
de ti, de mim, ali esquivos. 

 

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Mateus 7.6 – XXII

 

XXII

 

Raro, amor, é não saber no corpo a verdade explodindo, rasurar 
nos olhos o desejo de não ficar – assim – renunciada – 
anunciada morte.

 

Enquanto espero, amor, o teu abrigo alojando-se fresta: vou 
eclodindo em ti e perdendo-te na erosão visível.

 

Como se não valesse a pena a duração vou viver – sem 
esquecer – amor: de todo este lixo me fazes o desperdício. E o 
que resgatarás na vertigem (amor ) desta terra?

 

O meu nome, perdidamente, efémero resto de ti.

 

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Mateus 7.6 – XXI

 

XXI

 

Sinistra, amor, é a veloz fuga em que te desamparas riso ou 
choro – comoventes – origens do meu: escuta-me, escuta-me 
amor.

 

Não resistir e não poder absolutamente atingir-te no tormento, 
na volúpia; e tu submerso, enquanto na superfície a pele 
absorve toda a entrega de uma realidade derradeira: construída 
no envolvimento da água (amor) cativando-se.

 

E no céu os pássaros, abandonando-se à primavera, são como o meu 
corpo: rindo, rindo do horror deste inverno, amor.

 

Ali, a morte será como bailarina treinando a sua sombra ante 
um espelho opaco.

 

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Mateus 7.6 – XX

 

XX

 

Nem eu , amor, suspeitei que a fuga nos franquearia o poder de 
nos exilarmos em sossego, excedendo-nos força e atrito que 
impede a emoção de não consumar o simples. Como é saber 
fugir ignorando?

 

E quanto do mundo, da noite, da solidão, será como sabão 
misturando-se nas águas. E quanto de mim, em ti, será o sabão 
da solidão na noite do mundo?

 

E haverá uma água interdita (amor)? – agregando, cruel, a 
espuma subtraindo-nos – sós – puros ou sem pudor.

 

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